Diante da pandemia de coronavírus, a gestão de equipamentos de proteção individual (EPI) tem sido ameaçada por conta da escassez de máscaras. Apesar das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde quanto ao uso restrito de respiradores dos tipos N95 e PFF2 a profissionais de saúde e pacientes infectados, muitas pessoas acabam estocando o artigo em casa.
A consequência é que diversos hospitais brasileiros relatam falta de itens do tipo N95 e PFF2, específicos para ambientes contaminados por aerossóis – comuns em doenças respiratórias.
Expelidas na tosse, no espirro ou até mesmo na fala, as gotículas finas medem entre 1 e 5 micrômetros. São cerca de 30 vezes menores que um fio de cabelo. Além da invisibilidade, outro problema está no fato de que elas podem permanecer até oito horas no ambiente, sendo três horas suspensas no ar.
Entre as manobras médicas utilizadas em pacientes com Covid-19 estão a intubação e a aspiração, procedimentos que geram aerossóis. Por isso, respiradores N95 e PFF2 são indispensáveis para uso das equipes na linha de frente da assistência da pandemia.
As máscaras cirúrgicas também vêm desfalcando os estoques de EPI Brasil afora, ainda que sejam encontradas mais facilmente, pois sua fabricação é mais simples e barata. Aqui, é importante destacar que máscaras desse tipo não têm a mesma efetividade dos respiradores: ainda que a filtração seja suficiente, a vedação é falha e incapaz de conter as gotículas.
Mesmo assim, máscaras cirúrgicas são indicadas para uso de pacientes infectados, a fim de evitar a contaminação do ambiente e de outras pessoas. Como o volume de aerossóis é menor fora do ambiente hospitalar, esse tipo de proteção revela-se eficiente à população em geral.
Busca de alternativas
Em meio à pandemia, começaram a surgir na internet campanhas de arrecadação de máscaras de pano – muitas delas lideradas por profissionais de saúde. Apesar desses esforços, a infectologista Lessandra Michelin, diretora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), explica que não é possível determinar se a gramatura das fibras é suficiente para a filtragem do vírus.
“O grau de filtração das máscaras em condições secas e úmidas é importante para a segurança do profissional. No caso do tecido, é ilusão pensar que um pano grosso possa filtrar o vírus. Na verdade, ele acumula ainda mais umidade e expõe o usuário a diversos riscos”, descreve Michelin.
A infectologista aponta ainda que máscaras de tecido dificultam a respiração, fazendo com que o usuário tenha que movê-la diversas vezes para falar ou mesmo respirar. Outro problema é que, ao manusear a máscara eventualmente infectada, a pessoa eleva os riscos de infecção. “Além de tudo, não é simples adquirir tecidos adequados. Materiais cirúrgicos não são vendidos em lojas de tecido comuns”, destaca.
A especialista diz, ainda, que a higienização das máscaras de tecido geraria despesas extras aos serviços de saúde – que já enfrentam uma realidade financeira complexa. “Lavar e esterilizar exigiria esforços da lavanderia da instituição de saúde, que depende de insumos, ou seja, aumentaria o ônus.”
Para esclarecer dúvidas sobre a utilização de EPIs e a regularização do fornecimento de máscaras, o Sistema de Educação Continuada a Distância (Secad) preparou um guia sob a orientação de Lessandra Michelin, da SBI. Confira as recomendações:
Alternativa para driblar a escassez de máscaras
“Estamos usando a máscara cirúrgica por cima das PFF2 ou N95, para que durem mais. A máscara comum pode ser trocada a cada duas horas [em ambientes livres de contaminação] e é mais barata. Se não houver casos positivos de coronavírus no ambiente, a durabilidade de sete dias dos respiradores especiais salta para 30 dias”, explica.
Em casos de atendimento a pessoa contaminada, os respiradores devem ser higienizados após o uso, seguindo o protocolo de manutenção dos serviços de saúde. A medida de reutilização, inclusive, é recomendada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em nota, a instituição explica que “a estratégia ocorrerá de forma excepcional durante a pandemia”.
EPI: o “pacote Covid-19”
“O uso de todos EPI pelos profissionais de saúde vem sendo chamado de ‘pacote Covid-19’. Sempre que o profissional for notificado de um caso suspeito, deverá manejar o paciente com máscara, gorro, óculos, avental e luvas.” Quando houver casos positivos no ambiente, o profissional pode descartar os EPI ao final de cada turno. Em situações de atendimento individual, é preciso descartar toda a paramentação. Apenas o óculos e o respirador (N95 ou PFF2) podem ser higienizados e reutilizados.
Quem precisa usar máscara?
Profissionais que atuam na recepção dos serviços de saúde, como telefonistas e seguranças, não precisam utilizar máscara. “Quem precisa usar a máscara N95 ou PFF2 durante todo o período de assistência são os profissionais de enfermagem e médicos que atendem casos confirmados de coronavírus. Nutricionistas, por exemplo, que acompanham o paciente eventualmente, devem usar máscara cirúrgica apenas na hora do atendimento. Não há necessidade de circular pelo hospital o tempo inteiro de máscara.” A exceção ocorre para profissionais sintomáticos para gripes ou com H1N1 e que estejam trabalhando.
Atenção ao manuseio de EPI
A máscara só deve ser manuseada pelas tiras, tanto em sua colocação quanto ao retirá-la. É importante alertar aos profissionais quanto à falsa sensação de segurança. “Por estarem de máscara, muitas vezes eles esquecem de trocá-la e higienizam as mãos com menos frequência. Assim, acabam tocando no rosto e facilitando a contaminação. Jamais toque na parte da frente da máscara, pois é ali que estão concentradas as impurezas.”
Regularização dos estoques
No dia 20 de março, a Anvisa publicou uma resolução que flexibiliza a aprovação de insumos para contenção do coronavírus. Estão no pacote itens como máscaras, álcool gel e luvas. Empresas interessadas no fornecimento dos equipamentos devem se inscrever no edital da agência, desde que tenham o certificado prévio de boas práticas de fabricação. Nesse caso, a Anvisa se compromete em agilizar a aprovação dos produtos.
Ainda assim, como a iniciativa depende das indústrias, não há previsão de quando os estoques de EPI’s poderão ser reabastecidos de acordo com a demanda da pandemia.