21 de Outubro de 2021 | 3 min de leitura

Tratamento dos transtornos de ansiedade: qual fármaco de primeira linha é melhor?

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Artmed

Como citar este artigo: Raupp, M.D.C. & Salum Jr., G.A. (2021, 21 out.). Tratamento dos transtornos de ansiedade: qual fármaco de primeira linha é melhor?. Blog Artmed. https://blog.artmed.com.br/psiquiatria/tratamento-dos-transtornos-de-ansiedade-qual-farmaco-de-primeira-linha-e-melhor

Os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) – citalopram, escitalopram, fluoxetina, fluvoxamina, paroxetina, sertralina – e os inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSN, ou duais) – venlafaxina, desvenlafaxina, duloxetina – estão indicados como primeira linha para tratamento dos transtornos de ansiedade. Frente à variedade de opções terapêuticas, é natural que surja o questionamento: qual desses fármacos é melhor para o tratamento do transtorno de ansiedade do meu paciente?

Essa escolha pode (e deve) ser amparada pela medicina baseada em evidências (ensaios clínicos randomizados ou, preferencialmente, metanálises). Pois bem: uma metanálise em rede de três níveis publicada recentemente por Gosmann et al. encontrou resultados que apoiam a eficácia dos ISRS e IRSN, reforçando que esses medicamentos são efetivos nos transtornos de ansiedade (generalizada, social, pânico), nos transtornos relacionados a estresse (como o transtorno de estresse pós-traumático), e no transtorno obsessivo-compulsivo com um tamanho de efeito moderado – o que quer dizer que reduzem substancialmente os sintomas desses transtornos. Os pesquisadores encontraram melhora global da saúde mental em todas as categorias diagnósticas, não havendo importantes diferenças de eficácia entre os fármacos.

Quando foram realizadas comparações dos fármacos em pares, apenas pequenas diferenças foram encontradas em eficácia e tolerância. Os achados de eficácia favoreceram a paroxetina e o escitalopram em relação à sertralina, sem outras diferenças significativas entre todas as outras medicações. E não foram encontradas diferenças entre as medicações em relação às taxas de descontinuação do tratamento, mas quando avaliada descontinuação do tratamento devido a eventos adversos, a fluvoxamina foi mais descontinuada em relação a todos os outros medicamentos, com exceção da fluoxetina.

O que se pode concluir dos achados deste estudo, portanto, é que a escolha do melhor fármaco de primeira linha para o tratamento dos transtornos de ansiedade deve levar em conta muito mais as características do paciente em relação ao perfil de efeitos do fármaco do que a eficácia do fármaco por si só.

Dica prática: o que avaliar?

As características do paciente que devem ser levadas em conta vão desde a idade (pacientes idosos e com muitas comorbidades clínicas podem se beneficiar de fármacos com meia vida mais curta e com um pequeno número de interações medicamentosas, como o escitalopram), as suas comorbidades (pacientes com dor crônica podem se beneficiar da duloxetina, dado que esse fármaco também atua nos quadros dolorosos), o custo  (a fluoxetina é um fármaco amplamente disponível no sistema público), bem como a resposta prévia e a resposta familiar prévia.

Dica científica: por que esse estudo é interessante?

A abordagem em três níveis permitiu a análise estatística de uma maior quantidade de dados e com maior poder estatístico em relação aos estudos publicados até então, pois incluiu informação coletada por meio de diferentes instrumentos de avaliação e explorou eficácia em uma estrutura transdiagnóstica e multinível.

Transtornos de ansiedade, obsessivo-compulsivo e relacionados ao estresse frequentemente ocorrem em comorbidade, e os pacientes frequentemente apresentam sintomas de vários domínios. Essa metanálise avaliou a eficácia dos ISRS e IRSN em 30.245 pacientes com esses diagnósticos, sem restrições quanto a comorbidades entre si ou com qualquer outro transtorno mental (como depressão ou bipolaridade), idade ou gênero do paciente.

Todos os medicamentos foram mais eficazes que placebo para a medida agregada de sintomas internalizantes, para todos os domínios de sintomas e em pacientes de todas as categorias diagnósticas. Isso é importante porque vai ao encontro do mundo real, onde raramente os transtornos são encontrados de forma pura, como em alguns delineamentos de ensaios clínicos randomizados. Limitações do estudo incluem a moderada heterogeneidade encontrada na maioria dos resultados e o moderado risco de viés identificado na maioria dos ensaios.

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Editoria de Psiquiatria

Editor-chefe: Giovanni Salum Jr.

Médico com doutorado e pós-doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul com período sanduíche no National Institute of Mental Health (NIMH). Atuou como Coordenador da Saúde Mental do município de Porto Alegre entre 2017 e 2019. Professor do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da UFRGS. Diretor da Seção de Afetos Negativos e Processos Sociais do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).

 

Referências:

Gosmann NP, Costa MdA, Jaeger MdB, Motta LS, Frozi J, et al. (2021) Selective serotonin reuptake inhibitors, and serotonin and norepinephrine reuptake inhibitors for anxiety, obsessive-compulsive, and stress disorders: A 3-level network meta-analysis. PLOS Medicine 18(6): e1003664. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1003664


MR

Mariana Dias Curra Raupp

Médica especialista em Clínica Médica e residente de Psiquiatria pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre.